sábado, outubro 14, 2006

Prateleira #6 - Dookie

“I got no motivation
Where is my motivation?
No time for motivation
Smoking my inspiration
Sit around and watch the phone
But no one's calling
Call me pathetic call me what you will
My mother says to get a job
But she don't like the one she's got
When masturbation's lost it's fun
you're fucking lonely” em "Longview"

Recapitulemos. Em 1991, dá-se o culminar de um processo à muito anunciado. O Grunge. Torna-se oficial com o lançamento de Nevermind e Ten que o mercado está tomado de assalto. Cabelo comprido, jeans rasgados e, em suma, um ar desgrenhado são a moda para a juventude desses anos. Eddie Vedder e, principalmente, Kurt Cobain são os opinion-makers de uma juventude que se quer, paradoxalmente, iconoclasta, irreverente e revoltada com a sociedade. É o Grunge.

1991 é apenas o ano de consumação oficial perante a comunidade musical internacional. A mistura do hard-rock com as influências mais locais de Otis Reding ou Jeff Buckley levam a uma sonoridade que não se afasta muito do Rock mas que pela sua força, pelo contexto em que surgiu e pelas consequências que teve ganhou estatuto de género próprio. Dois anos depois, o Grunge está mais perto daquilo a que se convencionou apelidar de Pós-Grunge do que se imagina. Uma faceta mais melancólica e sombria paira em todos os álbuns do género, os Pearl Jam tornam-se cada vez menos ruidosos e os Nirvana caminham sem o saberem para o fim.

Em 1994, os Green Day vêm provar que a música, como a conhecemos nos meandros abrangentes da Pop-Rock, é um fenómeno cíclico. Este será o ano da grande mudança, pleno de simbologias. Os Nirvana editam MTV Unplugged in New York, o seu genial canto do cisne; os Pearl Jam editam Vitalogy (onde pontuam o genial “Corduroy” e o clássico “Betterman”); e, a 5 de Abril, Kurt Cobain é declarado morto. O mundo mudou. Há uma nova geração de adolescentes a despontar que exige música à altura da sua rebeldia. Há preocupações diferentes nesta geração. A falta de preocupações. Intencionalmente. 1994, o ano da morte de Kurt Cobain.

Entretanto, a editora Reprise repesca uns conceituados (no panorama punk, mas ainda relativamente desconhecidos do grande público) Green Day à Lookout e estes lançam Dookie. Pegam em Longview e fazem dele um sucesso de televisão e rádio. Os Green Day são os next big thing da MTV. Mas Dookie é mais que isso. Com este cd, os Green Day vêm marcar uma posição, uma atitude geracional que se prolonga ainda hoje, à espera de um 1994 que destrone o punk-rock da cadeira do trono.

Dookie é um cd, uma vez mais é à medida de Ten, geracional. Uma geração apolítica, desligada de tudo, narcisista, egocêntrica. Tudo isto conscientemente. A grande resposta à sociedade não é marginalizar-se, não é gritar, não é mudá-la. É viver dentro dela, ignorando-a. Pegando em muitas das duas atitudes e conceitos, esta geração revê-se na geração Punk de finais de 70’s. Conceptualmente, assim nasce o Punk-Rock, ou como alguns gostam de lhe chamar, o Punk-Pop.

Musicalmente, isto são também os Green Day. Contudo, apesar das semelhanças com a banda de Sid Vicious e com os The Clash, o Punk dos Green Day bebe mais dos ingleses Buzzcocks. Os Green Day soam a Buzzcocks que sabem que já houve Grunge. Músicas com a sonoridade de "Orgasm Addict", mas com mais bateria e mais desânimo. Letras afirmadamente adolescentes, sem teor político, com o gosto pelo choque com o estabelecido e o convencional. Letras que descrevem o quotidiano banal da América teenager e que tentam mostrar a deprimência dessa realidade, a banalidade.

O melhor do cd será isso mesmo. A proximidade e facilidade melódica dos refrões e das músicas em geral, o despretensiosismo quer do som quer das letras, como ponto de ruptura com o snobismo musical da cena melancólica pós-grunge. Ainda assim, Dookie é um álbum repleto de humor e sarcasmo face a uma sociedade cheia de desemprego, solidão e falsos valores. O cd começa num tom constante que parece apenas querer levar a “Longview”, a quarta faixa, hino frenético sobre masturbação e solidão. Um hino desencantado que, por altura do refrão, ganha energia para explodir de descontentamento. Segue-se outro clássico, “Welcome to Paradise”. Ligeiramente mais guitarreiro, mais rockeiro, ilustra a versão irónica da banda, onde se canta: “I want to take you through a wasteland / That I like to call my home / Welcome to Paradise”.
Saltamos “Pulling Teeth” e chegamos a outro dos grandes clássicos do cd. “I am one of those / Melodramatic fools / Neurotic to the bone / No doubt about it” é a honestidade neste agressivo composto punk onde pontua o narcisismo, a necessidade de expressão centrada no eu que é "Basket Case". Segue-se “She”, com início de falsa balada num exercício claustrofóbico que remete para “O grito” de Munch. Segue-se sempre no mesmo tom por “Sassafras Roots” até a outro clássico. “When I come around”, pleno de vitalidade e força, novo hino intemporal nos charts do Punk-Rock. Uma parte final ligeiramente mais fraca até chegar a "F.O.D.", a que depois se seguirá uma faixa bónus.

Muitos diriam que os Green Day, enquanto banda Punk se venderam em 1994. Para os puritanos do Punk, talvez. Para o resto do mundo foi a assunção de uma nova realidade musical que hoje discute com os Coldplay a sucessão aos U2 no trono de maior banda do momento. Pela voz de Billie Joe Armstrong, tiraram o Punk do baú e deram-no às massas, abrindo lugar a bandas posteriores de grande impacto como os Blink 182. Em Dookie têm o seu melhor momento. O menos comercial, o menos dirigido à MTV, ao mercado, o mais virado para a música enquanto música. Música imortal com a duração de uma juventude.

Título: Dookie
Autor: Green Day

Nota: 9/10

4 Comments:

Blogger Dorian Gray said...

Não podia concordar mais.

Hasta

3:10 da manhã  
Anonymous Anónimo said...

Não te iludas rapaz... punk é NOFX, Tha Clash, Sex Pistols e, vá lá, Pennywise. Se queres punk à antiga feito hoje, ouve Towers of London.

De qualquer das maneiras, crítica muito bem redigida, continua assim.

2:16 da manhã  
Blogger Olavo Lüpia said...

Jesus!
Guardo a sensação de ter entrado num universo paralelo...
Lamento, mas não posso concordar.
E a nota parece-me inflada. Muito inflada.
Mas cá está, cada opinião é o que é!
Nonetheless, faço minhas as palavras anteriores: gostei da escrita - o disco até ficou melhor, veja lá!
Abraço.

1:54 da manhã  
Blogger Unknown said...

A coisa aqui é bem simples. Essa coisa rotulística de punk ou não punk é o de menos. O importante é q Dookie é um album q estará no coração e na lembrança de muita gente. O sucesso se deu por uma junção de fatores, o timming perfeito pro lançamento e as suas letras que davam voz a não uma geração de adolescentes, mas a qualquer geração de adolescentes.
É incrivel como vc sente q as letras dizem exatamente o que vc sente.
Não creditaria uma genialidade ao autor, mas creditaria como um momento de muita sorte e felicidade, pois, com a ajuda óbvia do mercado favoravel, as letras de Dookie eram exatamente o que se se queria ouvir aos 10, 12, 14 anos de idades.

10:45 da tarde  

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