sábado, março 03, 2007

Notes on a Scandal


"We are bound by the secrets we share."


Notes on a Scandal - Diário de um Escândalo

Baseado no romance homónimo de Zoë Heller, Notes on a Scandal trata do diário de Barbara Covett (Judi Dench), uma professora numa escola pública do norte de Londres. À beira da reforma, Barbara é uma mulher cínica e amarga, que fuma sem parar, que despreza os seus colegas e alunos, que anseia por sair daquele antro de testosterona e criminalidade. É nesta condições que Sheba Hart, uma recém-chegada professora de Artes (Cate Blanchett), conhece Barbara. Desde logo, a frescura e jovialidade da liberal professora provocam uma repulsa condescendente em Barbara. Porém, à medida que a domesticada professora da classe média se imiscui no meio dos professores, Barbara vê em Sheba uma oportunidade.

Então, durante uma festa de Natal, Barbara descobre que Sheba tem um caso com Steven Connolly (Andrew Simpson), um aluno irlandês. Aí, a velha professora propõe-se confidente de Sheba e força-a a confessar as suas aventuras sexuais com o rapaz de quinze anos. Ao longo da sua narração dos acontecimentos, a situação parece mais profunda do que realmente aparenta ser: Barbara vê neste delicioso affair uma oportunidade para fundir a sua vida de solidão com a boémia burguesa da família Hart, tornando a trama numa espiral de obsessão.

O livro Notes on a Scandal foi escrito como sendo um diário de Barbara, pelo que a sua adaptação para o cinema foi especialmente difícil. Assim, o filme não gira totalmente em volta dos pensamentos da neurótica professora, embora exista uma extensa e inteligente narração de diversos eventos, deixando sempre margem para o destaque das cenas de intimidade entre Sheba e Connolly. O guião de Patrick Marber está absolutamente bem conseguido, oscilando entre o íntimo e cru, e o ácido da voz de Judi Dench sobre os acontecimentos mais banais (tão fielmente descritos no seu diário).

Judi Dench consegue em Notes on a Scandal uma das suas melhores interpretações de sempre. Será difícil esquecer todo o ódio do seu olhar, toda a loucura delirante que transborda em cada gesto, toda a obsessão doentia que transmite nas acutilantes palavras. Dench traz-nos uma interpretação maravilhosa, o que, aliado ao seu cabelo pós-menopausa e a uma escolha adequadíssima de um guarda-roupa naftalínico, faz de Barbara uma personagem muito bem criada.

Ao seu lado está a maravilhosa e belíssima Cate Blanchett, com uma Sheba etérea e perfeitamente confusa, um alvo perfeito para os pensamentos eróticos de qualquer rapazinho. Apesar do seu seguro casamento com um homem mais velho (Billy Night), Sheba perde-se na sua insegurança face ao seu aspecto, acabando por se envolver com um rapaz de quinze anos. Aqui, a fabulosa interpretação de Blanchett expõe duas forças muito presentes em todo o filme: a inveja luxuriosa de Barbara e o desejo do pseudo-naïf Connolly. O contraste entre o ambiente conformado de uma casa igual a tantas outras com a realidade de um beco onde a bonita professora se envolve com o seu aluno sardento remete-nos para um plano muito mais denso do que o próprio desejo: será tudo um fantasiar de quem deseja sair do que lhe foi impingido, ou existiu verdadeiramente algum motivo superior para que tudo aquilo acontecesse? A resposta a esta pergunta é verdadeiramente conseguida pela câmara de Sir Richard Eyre sobre o corpo de Blanchett.

Quanto a Andrew Simpson, o jovem actor que interpreta Steven Connolly, é espantosa a qualidade do modo como está tão presente na película. Os seus momentos ao lado da diva Blanchett são verdadeiramente surpreendentes: Simpson é suficientemente maldoso, suficientemente cruel, suficientemente sedutor, incrivelmente brilhante. É uma pena que a sua personagem corra o risco de se diluir por entre alguns aspectos, também eles excelentes, deste filme.

A realização ficou a cargo do experiente Sir Richard Eyre, que consegue arrancar algumas das melhores interpretações por parte do elenco. Mesmo Bill Nighy e Michael Maloney brilham em personagens muito bem enquadradas na tela. Independentemente de personagens, a abordagem de Eyre à tensão emocional, ao clima sexual, à extravagância das situações, à maldade da obsessão, e mesmo a todo o ambiente patológico que se respira neste filme, é uma obra de mestre. Junte-se a genial partitura de Philip Glass, que, apesar de não andar muito longe do seu trabalho em “The Hours”, perfuma cada um dos momentos e cada uma das personagens com uma harmonia intencionalmente escorregadia e com uma profundidade de cortar a respiração.

Assim sendo, Notes on a Scandal - nomeado para quatro Óscares e um BAFTA - faz uma excelente aproximação a um grande livro (que explora um pouco mais o pequeno Connolly), apresenta uma realização pacífica e adequada, entrega algumas das melhores interpretações de sempre, reinventa uma abordagem feminina, torna o olhar do espectador diferente. Ultrapassa barreiras sociais, esquece o que é do burguês ou do proletário, desmistifica o sexo ilegal e imoral (sem nunca o condenar), mostra o que há de mais intenso no ser humano: o desejo e o segredo, o erro e a oportunidade. One Woman's Mistake Is Another's Opportunity.


Título/Ano: Notes on a Scandal (2006)

Escrito/ Realizado por: Patrick Marber/ Sir Richard Eyre

Elenco: Cate Blanchett, Judi Dench, Andrew Simpson, Bill Nighy, Michael Maloney, Tom Georgeson, etc.

2 Comments:

Anonymous Anónimo said...

Só pelas actrizes já deverá valer a pena (mas parece-me que o trailer revela demasiado). A ver em breve...

3:12 da manhã  
Blogger L said...

Não só o trailer revela demasiado, como se opta por expôr por completo o affair logo no início do filme. Parece arriscado, mas nunca se perde o interesse.

7:46 da tarde  

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