quarta-feira, fevereiro 14, 2007

Bobby

Escrito e realizado por Emilio Estevez, o filho mais velho de Martin Sheen, Bobby combina, com alguma alegria, a campanha do Senador Robert Kennedy nas eleições primárias e a vida agitada de vinte e duas outras personagens. Tudo isto se passa no Hotel Ambassador, a sua sede de campanha, no dia em que ele foi assassinado. Este emaranhado de personagens ajuda a criar o ambiente que se vivia nos anos 60, descreve as tensões raciais e sociais que se sentiam na altura, lida com a ameaça iminente do Vietname e com a ascensão de uma cultura pop centrada nas drogas. Embora nenhuma personagem tenha uma história arrebatadora – o próprio Kennedy funciona como uma sombra – há que destacar que todas elas explicam ao espectador a necessidade que o mundo tinha de um homem como Bobby Kennedy.

Dentro do hotel, tomamos contacto com uma atmosfera onde se respiram ideais elitistas e falsos moralismos. Conhecemos a cantora alcoólica Virgina Fallon (Demi Moore) e o seu submisso marido Tim (Emilio Estevez), olhamos para a vida de um amargurado homem (Martin Sheen) e da sua mulher supérflua Samantha (Helen Hunt) na demanda de um par de sapatos pretos. Vivemos as primeiras experiências de LSD de dois jovens apoiantes de Kennedy sob a perspectiva pseudo-hippie de um traficante de droga com ares de zen (Ashton Kutcher).

No lobby do hotel, o já aposentado porteiro John Casey (Anthony Hopkins) joga xadrez e diz umas quantas frases com sentido, uma jornalista checoslovaca (Svetlana Metkina) quer à força uma entrevista com o Senador Kennedy, embora esta lhe seja recusada pelo esterótipo do americano inculto (Joshua Jackson) – que não sonha sequer onde fica a Checoslováquia e que confunde Socialismo com Comunismo. E há, claro, a esteticista deste role de personalidades (Sharon Stone) que tenta salvar o seu casamento e encoraja uma sardenta noiva americaníssima (Lindsay Lohan) a casar com um dos seus colegas de escola (Elijah Wood) impedindo-o de morrer no Vietname.

Nas cozinhas, o gerente do hotel Paul Ebbers (William H. Macy) luta contra as atitudes racistas, fechando-se depois numa relação adúltera com uma telefonista (Heather Graham). Enquanto isso, os empregados da cozinha vivem uma tensão racial imensa, salva apenas pelas pérolas de sabedora do chef Edward (Lawrence Fishburne) ainda com muito ar de Matrix.

Se parece impossível explorar vinte e duas personagens em duas horas, então Bobby é um filme interessante. No final, independentemente da relevância das histórias e peripécias, e ainda que algumas coisas não pareçam encaixar muito bem, temos um mosaico muito bem construído, com alguns momentos a tender para o comovente. Assim sendo, é fácil achar Bobby um filme bom. Porém, depois de alguns actores desfilarem diante dos nossos olhos, o juízo acaba por ser outro: esqueça-se a coerência e a consistência das histórias, pegue-se na mensagem. O problema é o medo que se tem de que a mensagem, tal como a boa montagem de imagens reais de RFK na película, se dilua num filme a meio gás.

A acção está muito ritmada, goza de uma frescura interessante, a fotografia é boa. O espectador traduz tudo isso para: este filme faz ressoar a situação política americana dos dias de hoje… até se pode ler um desejo de tirar os republicanos e o seu ideal conservador de trazer por casa para fora de Washington. É por isso que ficam tão bem os comentários anti-racistas, os momentos climáticos com "The Sound of Silence" de Simon & Grafunkel, a sequência final com o fantástico discurso de Robert Kennedy, a emoção que nos prende nos assentos a ver as fotografias históricas do clã Kennedy.

Esquecemos tudo o que se sabe sobre RFK quando nos sentamos para ver este filme e este não é um filme sobre um homem, sobre Bobby. Este é um filme sobre quem precisou de Bobby, de quem precisava de projectar em alguém todos os desejos de mudar o mundo, de tornar os E.U.A. num local socialmente habitável e moralmente perfeito. Isto dá ao filme uns agradáveis contornos actuais, ou seja, cada espectador vê em Bobby qualquer coisa que quer ver. E, aparentemente, isso funciona, o que, apesar de não ser necessariamente mau, não é suficiente para cobrir muitas das falhas deste filme.


Título/Ano: Bobby (2006)

Realizado/Escrito por: Emilio Estevez

Elenco: Anthony Hopkins, Demi Moore, Sharon Stone, Elijah Wood, Harry Belafonte, Nick Cannon, Emilio Estevez, Laurence Fishburne, Heather Graham, Helen Hunt, Ashton Kutcher, Shia LaBeouf, William H. Macy, etc.